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Conforto das Partes nas Audiências Virtuais

FLÁVIO LUIS DOS SANTOS – OAB PR 78.746:
Advogado no escritório Nascimento & Schreiner, graduado
em Direito pela UNIVEL; Especialista em Segurança
Pública, Cidadania e Direitos pela UNIOESTE; Mediador e
Conciliador Judicial e, terceiro facilitador em Justiça
Restaurativa no CEJUSC de Cascavel; Gestor da Câmara
de Métodos Alternativos de Solução de Conflitos Cascavel –
C.M.A.S.C.; Membro da Comissão de Métodos Alternativos
de Solução de Conflitos – CMARC – da Sub Seção da
OAB/Cascavel; 2° Secretário da Associação Metodista de
Ação Social em Cascavel - AMAS;


“Faça todo o bem que puder,
Por todos os meios que puder,
De todas as maneiras que você pode,
Em todos os lugares que você puder,
Em todas as vezes que você puder,
Para todas as pessoas que você puder,
Enquanto você pode sempre”.
John Wesley


Indubitavelmente a Mediação de Conflitos surge no cenárioJurídico brasileiro, como uma forma de possibilitar que o “bem” seja feito, através de diretrizes, técnicas e princípios que norteiam o bom andamento das sessões, em que são realizadas as Mediações, sejam elas Judiciais ou Extrajudiciais. Este Método de Solução de Conflitos, oportuniza que as partes conflituosas se manifestem, a respeito dos anseios que possuem sobre o conflito existente na relação. Há através da mediação extrajudicial, a possibilidade de se evitar, que uma das partes ingresse com ação judicial.

No dia 26 de junho de 2015, foi publicada no âmbito nacional a Lei n° 13.140, a qual versa sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração Pública. Após isso, no dia 01 de novembro de 2016, na comarca de Cascavel PR, no âmbito do Poder Judiciário Estadual foi inaugurado o Centro Judiciário de Solução de Conflito - CEJUSC, o qual iniciou as atividades presenciais sendo a Mediação o seu principal serviço.

Na lei supramencionada, em seu artigo 2° encontramos os princípios, pelos quais a mediação será orientada, vejamos: imparcialidade do mediador; isonomia entre as partes; oralidade; informalidade; autonomia da vontade das partes; busca do consenso; confidencialidade e boa fé. As partes envolvidas nos conflitos submetidos à mediação, figuram como protagonistas do procedimento, haja vista a possibilidade de expressarem seus sentimentos, bem como de relatarem, os reais motivos pelos quais, visualizam a existência do conflito em questão e somado a isso, através da autocomposição decidirem por si só a respeito da resolução do conflito, retirando a necessidade de que um terceiro decida a questão.

De suma importância nas audiências de mediação, é a presença do Advogado, o qual, através de seu conhecimento técnico a respeito do assunto que será mediado, proporcionará ao cliente o amparo para eventuais dúvidas ou questionamentos no que se refere aos acordos que possam ser celebrados. Tanto é que, no transcorrer das sessões, o mediador que estiver conduzindo o procedimento, oportunizará que, após a manifestação de ambas as partes a respeito do conflito, os advogados presentes, se manifestem com os apontamentos jurídicos pertinentes ao momento.

A Emenda n° 2 de 08.03.2016, incluiu na Resolução 125/2010 do CNJ a seção III-B, a qual versa sobre as Câmaras Privadas de Mediação e Conciliação. Além disso o Código de Processo Civil, também possui orientações a respeito de procedimentos a serem adotados por tais Câmaras, as quais, dentre outras atividades, realizam sessões de Mediação. Diferente do Poder Judiciário, as Câmaras Privadas, além do atendimento presencial para a realização de sessões de Mediação, também dispunham do referido atendimento na plataforma Virutal.

Eis que, com o surgimento da Pandemia originada pela COVID19, os atendimentos presenciais tanto no setor público quanto no privado, tiveram que passar por restrições, em virtude de medidas de precaução afim de evitar o contato físico aproximado entre as pessoas. Com isso a plataforma virtual ganhou força, sendo que o Poder Judiciário a utilizava em alguns procedimentos, tais como audiências por vídeo conferência envolvendo pessoa com restrição de liberdade, dentre outras, passando assim a utilizar tal formato na realização de audiências de mediação. Essa circunstância ensejou na criação do CEJUSC Virtual em algumas comarcas no Estado do Paraná.

Contudo, o isolamento social não foi motivo para que os procedimentos de mediação diminuíssem, pelo contrário, atualmente vem se realizando com frequência e, assim como no formato presencial, resultados positivos estão sendo alcançados. Haja vista que não raras vezes, acordos se realizam, possibilitando o término de processos ou até mesmo evitando a judicialização, de questões que foram submetidas ao procedimento de mediação pré processual, ou seja, antes do ingresso propriamente dito de ação judicial sobre o caso.

Ao se realizar uma análise paralela dos formatos presencial x virtual, pode-se diagnosticar questões que ensejam adaptação quanto a sua forma de realização. Isso porque, no atendimento presencial, o mediador possui maior visão a respeito do conforto de ambas as partes, possibilitando-lhes dar o suporte adequado, afim de que prossigam de maneira confortável no transcorrer da sessão. Entende-se por confortável, desde a questão física até a emocional, pois presencialmente é possível averiguar desconfortos tais como: ambiente abafado, barulhos inoportunos, pessoas emocionadas, ou até mesmo irritadas.
Agora, diante do formato virtual, tais constatações podem, eventualmente passarem despercebidas pelo mediador que conduz a sessão.

Outra forma de desconforto entre os envolvidos na mediação, é a necessidade de ter uma orientação mais específica do Advogado que lhe acompanha no procedimento. Tal fato, deve-se principalmente pelo posicionamento do cliente e do advogado, pois em determinados casos, ambos estão em locais diversos, ou seja, não possuem o contato direto para se comunicarem no transcorrer da sessão.

De suma importância que o Advogado esteja atento a tais questões referente ao conforto de seu cliente, sendo que dentre as técnicas utilizadas pelo mediador, está a possibilidade de aplicar sessão individual durante o procedimento. Via de regra, o mediador utilizará dessa ferramenta, se porventura constatar que o diálogo entre as partes está com ruídos e obstáculos, que estejam dificultando o prosseguimento da sessão de mediação. No entanto, poderá o Advogado intervir junto ao mediador, no sentido de possibilitar o contato a sós com o cliente.

Tal como descrito no parágrafo anterior, a sessão individual é uma técnica muito importante para audiências virtuais, mesmo não havendo ruídos nas comunicações dos participantes durante a sessão de Mediação. Vale ressaltar, que por vezes, os Advogados estarão acompanhando clientes que não possuem o costume de comparecer em juízo afim de participar de audiências.
Frequentemente, verifica-se que pessoas nessa condição, sentem-se constrangidas diante das formalidades existentes nos procedimentos judiciais, não sabendo como se portar e nem mesmo quais os momentos adequados para se manifestarem.

Vale ressaltar, que a sessão de mediação é uma grande oportunidade de que as partes possam resolver o conflito, diante disso há a necessidade de lhes dar o conforto adequado. De suma importância, é a orientação prévia ao cliente sobre o procedimento a ser adotado, tanto no formato presencial, quanto no virtual, através da exposição de qual a função de cada participante da mediação, bem como em quais momentos ou circunstâncias o cliente poderá ou deverá se manifestar. Muito embora essas orientações façam parte da declaração de abertura, a que via de regra o mediador fará no início da sessão mediação, acredita-se que a orientação prévia ao cliente, antes de iniciar a sessão propriamente dita, faz com que Advogado e cliente, mesmo estando em ambientes distantes, possam criar uma sintonia entre si. Possivelmente facilitará o andamento da sessão de mediação, bem como oportunizará ao cliente aproveitar o momento a que se destina tal audiência.

Voltando a questão da Sessão Individual, tal técnica consiste em manter uma das partes, devidamente acompanhada por seu advogado dentro do ambiente de mediação, junto com o mediador. Enquanto isso, a outra parte permanecerá em ambiente diverso com seu defensor, de tal forma que não tome conhecimento do que está sendo abordado na sessão individual. Tal procedimento é recíproco, ou seja, o mesmo tempo que o primeiro participante e seu advogado permanecem com o mediador sem a presença da outra parte, o segundo e/ou demais participantes também permanecerão em tal situação.

A Sessão Individual, também denominada de Sessão Privada, é utilizada por diversos motivos entre eles: “i) para permitir a expressão de fortes sentimentos sem aumentar o conflito; ii) para eliminar comunicação improdutiva;

iii) para disponibilizar uma oportunidade para identificar e esclarecer questões;

iv) como uma contramedida a fenômenos psicológicos que impedem o alcance de acordos, tal como a reação desvalorizadora1

v) para realizar afagos;

vi) para aplicar a técnica de inversão de papéis; vii) para evitar comprometimento prematuro com propostas ou soluções;

viii) para explorar possível desequilíbrio de poder;

ix) para trabalhar com táticas e/ou habilidades de negociação das partes;

x) para disponibilizar um ambiente propício para o exame de alternativas e opções;

xi) para quebrar um impasse; xii) para avaliar a durabilidade das propostas;

xiii) nas situações em que se perceberem riscos à ocorrência de atos de violência”2

Diante dos motivos relacionados acima, é possível identificar várias situações, em que possivelmente não sejam apresentadas pelas partes durante a sessão conjunta, ou seja, na presença da outra parte. Assim sendo, o Advogado dentro de sua contribuição para com o procedimento, possui a oportunidade de afagar seu cliente, bem como de instigar o mesmo, fazendo com que se expresse com maior naturalidade e aproveite a oportunidade que lhe está sendo concedida, contribuindo para que o mediador possa construir estratégia adequada para reunir as informações de ambas as partes, visando auxilia-las a

1 A reação desvalorizadora consiste na resposta negativa a uma proposta em função da pessoa que a apresentou. Exemplificativamente, muitas partes em conflitos de elevada litigiosidade tendem a rejeitar uma proposta pelo simples fato de ter sido feita pela pessoa com quem alguém se encontra em conflito.

2 https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2015/06/f247f5ce60df2774c59d6e2dddbfec54.pdf

chegarem à recíproca satisfatoriedade no que tange eventual possibilidade de acordo.

O afago é um reforço positivo, com a finalidade de fazer com que, a parte interessada na resolução do conflito continue com comportamento ou postura positiva no procedimento de mediação. Clientes atendidos por defensores nomeados, muitas vezes possuem o primeiro contato com o  Advogado, tão somente no momento da audiência, sendo que no ambiente presencial, ainda há uma prévia possibilidade de estabelecerem o primeiro contato antes do início da audiência. Já no ambiente virtual, esse contato via de regra não existirá, ou seja, ambos se conhecerão visualmente, apenas quando já estiverem on-line com a presença dos demais participantes.

O grande número de conflitos que diariamente são levados ao judiciário, possibilitam o que chamamos de congestionamento processual, fazendo com que os procedimentos e respectivos julgamentos sejam morosos.
Tanto para o Advogado quanto para o cliente, por diversas vezes o conflito se torna desgastante e oneroso. Via de regra as audiências, sejam elas de conciliação ou de instrução, não possibilitam com que as partes se manifestem de maneira completa, com a exposição de sentimentos, de pedidos de desculpas, de oportunidades de reconciliações. Em sentido contrário caminha a Mediação, a qual, diferente do que se possa imaginar, não tem apenas o objetivo de solucionar a controvérsia. O empoderamento das partes, que é a oportunidade de fazer com que adquiram consciência que são capazes e possuem qualidades suficientes para, através do diálogo resolverem um conflito de forma amigável, evitando assim que um terceiro alheio aos sentimentos e aflições que em tese estariam relacionadas ao conflito, profira sua decisão. Vale ressaltar que determinadas decisões judiciais podem ser desagradáveis para uma das partes, ou até mesmo para ambas.

Neste contexto, ao Advogado surge a possibilidade não só de representar tecnicamente seu cliente durante a sessão de Mediação, mas também servir de suporte, através de uma visão prospectiva, auxiliando o cliente a compreender as técnicas e diretrizes adotadas na Mediação, bem como se atentar no bem estar do cliente durante a sessão, principalmente no modo virtual, afim de que o conforto seja estabelecido para o cliente, possibilitando que se manifeste de forma clara e coesa com o firme propósito de ver o conflito satisfatoriamente resolvido.

Referências:

RISKIN, Leonard et al. Dispute Resolution and Lawyers. Minneapolis: West Group, 1997; COOLEY, John. A

advocacia na mediação. Brasília: Ed. Universidade de Brasilia, 2001; e MENKEL-MEADOW, Carrie et al. Dispute

Resolution: Beyond the Adversarial Model. Nova Iorque: Aspen Publishers, 2005;

https://www.tjpr.jus.br/cejuscvirtual; https://www.cnj.jus.br/.

Cascavel, 27.08.2020.


Flávio Luis dos Santos

OAB PR 78.746

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Conforto das Partes nas Audiências Virtuais