45. 3224-4896

Pessoas pra conhecer antes de morrer (Luciana Chemim)

Toda pessoa deveria escrever um livro. Na realidade, um não. Vários. 
Nem que sejam livros internos. Nem que seja para reler vez ou outra, rasgar umas páginas, reinventar outras, se redescobrir em um título, se perder em outro, tentar repetir os melhores capítulos, reavivar sentimentos que, sabe-se Deus porque ou, mesmo sem razão alguma, se escapuliram do nosso peito pra se refugiar em algum canto da nossa alma. 
Alguns vão me chamar louca, mas faço isso desde sempre. E, afinal, de louco e santo todo mundo tem um pouco, não?
Coleciono livros internos desde que descobri que os diários não eram secretos como eu pensava que poderiam ser. Desde que percebi que até nossos livros internos podem ser compartilhados com aqueles de coração aberto. 
E o melhor de tudo, pode-se mudar a todo instante o desenho, a forma, a letra, o foco da história. Pode-se fazer graça daquilo que um dia foi triste.
É, não dá pra apagar o que um dia foi escrito. Mas dá pra transformar, pra colorir, pra colocar umas fitas, um sol no canto superior da página. Dá pra pegar atalhos quando já se conhece o caminho. Dá pra evitar tombos. 
Dá pra escrever o final que quisermos, afinal, somos nós os autores.
Hoje estou no capítulo 200 do meu livro interno intitulado “Pessoas pra conhecer antes de morrer”. 
Sei que o título não tem nada de original, mas não achei nenhum outro que definisse melhor os personagens do meu livro. 
Eles nem imaginam, mas cada um tem de mim uma crônica, um conto, uma lembrança, um sorriso antes de fechar os olhos, um versículo bíblico, uma poesia de Vinícius. Alguns têm até trilha sonora. Outros me arrancam risos porque transpiram alegria de viver e assim me contagiam, mesmo sem querer e, talvez, sem saber.
Alguns ainda fazem história comigo. Outros encerraram seu livro da vida, ao menos nesse plano e me deixaram as lembranças, as referências, os exemplos.
Há os que encontro todo dia. Há os que vejo apenas nos feriados. Também há os que encontro uma vez por ano e aqueles que nunca mais encontrei, mas que se tornaram, de certa forma, parte do que sou. 
São pessoas extraordinariamente comuns. Não do tipo arroz com feijão. Mas do tipo piquenique na segunda-feira. 
Pessoas que são notadas assim que chegam num ambiente, não por possuírem uma beleza física de parar o trânsito, nem pela inteligência desconcertante. Mas por carregarem com maestria seu brilho próprio. 
Pessoas que sabem sorrir com o corpo todo. No dizer de Fabrício Carpinejar, pessoas que possuem um olhar tipo “boca de cílios”.
Meu livro está repleto de pessoas assim. Você pode desconfiar. Pode achar que tenho sorte (e eu tenho mesmo). E pode até achar que sou uma iludida convicta. Não descarto nenhuma das possibilidades e amontoaria mais umas três, pra ser minimalista. 
Mas, simplificando, a verdade é que procuro (nem sempre consigo, admito) enxergar e exaltar o melhor que há em cada pessoa que atravessa alguma esquina da minha estrada. Não, não se trata de ser “boazinha” (quer rótulo pior para uma mulher?). Apenas olho antes a flor, depois o espinho. Há vezes em que o “santo não bate” e aí não há reza que salve. Há vezes em que o coração palpita errado. E, claro, o critério é subjetivo. Só doido pra dizer que não. 
Haverá pessoas que estamparão os melhores capítulos do meu livro e que não serão sequer nota de rodapé no seu. Adoro a diversidade da vida. A possibilidade de ser diferente, de fazer escolhas que se distanciam do comum. 
Mas, o fato é que há o unânime. O incontroverso. Pessoas que caem bem com o clássico tubinho preto tanto quanto com o meião e a chuteira. Pessoas que fazem o coração assoviar. Pessoas que não precisam verbalizar porque se comunicam com os outros sentidos. Pessoas polo positivo. Pessoas cuja energia faz cócegas na alma. Pessoas sem tempo pra infelicidade, para escarafunchar a vida alheia. Pessoas que investem nos amigos que a vida traz. Pessoas que cultivam boas histórias. Pessoas que sabem arrancar risadas dos tombos que a vida dá. Pessoas que comemoram suas pequenas vitórias como se fossem delas próprias. Pessoas que abraçam, que acolhem, que agradecem. 
Foram pessoas assim que motivaram meu livro interno. Poderia nominá-las, mas prefiro que elas mesmas se reconheçam no que digo, no que escrevo, no que omito e, especialmente, no que vivo.
Cada vez que as encontro, pessoal ou virtualmente, penso: “essa pessoa todo mundo deveria conhecer antes de morrer”. 
Se você chegou até aqui, provavelmente seja uma dessas pessoas.
Se ainda não cruzou alguma esquina da minha estrada, apenas um aviso: aqui só se entra com amor. No mais, seja bem-vindo (a)!